terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Eu esqueço tudo

Conheci uma garota que era do Barbalho... uma garota do barulho..."


Conheci o Barbalho. Só conhecia o Barbalho de música, não exatamente o Barbalho, mas a garota do Barbalho e mais ainda seu namorado. Mas não, agora era o Barbalho mesmo que me acolhia e eu chegava tímida.O Barbalho é tão calmo. Parece interior. Tem casinhas, tem muro baixo, tem árvore. Ao menos esse era o Barbalho que eu senti ao chegar na porta da escolinha. O chão de paralelepipedos, o som dos passarinhos, algumas crianças bem pequenas brincando na rua, sozinhas, olhos adultos bem de longe. Fazia sol... meu Barbalho é ensolarado.
Sentei no fundo da sala e sem muito êxito tentei passar desapercebida. Mas não deu. A professora me apresentou e os meninos ficaram me olhando, até que uma gordinha de tranças no cabelo e que não parava de sorrir, quebrou o silêncio:- Do sítio do pica pau amarelo??!!!Ufa! Tornou-se mais fácil estar ali sem intimida-los e sem ficar intimidada por eles.Sorri para ela e uma vez ou outra me chegavam sorrisos e olhares estranhados... até que se acustumaram com minha presença. Uma menina da outra turma, mais velha, perguntou pra professora se eu seria sua professora no ano que vem. Sorri, explicando que não era professora. E ela me indagou o que eu estava fazendo ali então... Aprendendo! Com a professora? Não... com vocês. Ela riu e na hora de ir embora me disse: Tchau aluna!
Turma de alfabetização. Seis, sete anos. Fui conhecer João, seis anos. Sujeito da minha pesquisa para um trabalho de psicologia do desenvolvimento.Garoto simpático. Solto. De gestos amplos, criança mesmo, que gosta de jogar bola, brincar de pega-pega e esconde-esconde e de fazer dever de casa. A mãe dizia que era preguiçoso, que não gostava de estudar. A professora dizia que não tinha muito apoio em casa pros estudos, que era um pouco preguiçoso na aula também. Ele me disse que a coisa que mais gostava de fazer era dever de casa, que gostava de brincar também, "mas menos". Só que dos 10 deveres, fazia... uns quatro!"É que eu esqueço tudo". Tudo o que João?? Lia bem, se atrapalhava sempre com o A em nomes próprios... justo... parecia mesmo um C! Menino esperto, líder nas brincadeiras, bom de bola... comia o lanche dos colegas, sempre as meninas ofereciam biscoito recheado... ai ele deixava o lanche de casa pra depois!
Veio o intervalo e fui surpreendida por João, curioso, olhando pra mim.Eu ainda não ia entrevista-lo e não o fiz... mas conversamos.

- Advogado de tropa de elite? É?
-É. Eu vi o filme com meu pai! Quero ser advogado de tropa de elite.
-Hmm... e como é advogado de tropa de elite, o que que ele faz?
-Ele tem uma bazuca e mata as pessoas!
-E você que matar as pessoas com uma bazuca?
-Ah. É bom porque tem dinheiro!
-Ah... quer dizer que é bom porque tem dinheiro... mas será que não é ruim matar alguém não?
-Não sei!
- E advogado só? Não precisa de bazuca, nem matar ninguém.
-Ahhhh... sei lá.
Conversamos mais um tanto de coisa... Essa semana fui entrevista-lo. O Barbalho ensolarado.

-E então João... O que você quer serquando crescer mesmo?
- Não quero ser advogado de tropa de elite mais não.
-É? Porque?
-Quero lutar judô e ganhar um monte de medalhas.

Sai do Barbalho, questões... e me perdi tentando voltar pra casa. Quando foram mesmo as Olimpiadas? Segunda estarei lá de novo... e o que João vai ser quando crescer?

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